Dando sequência aos últimos posts sobre resíduos, tratamos aqui das cooperativas de triagem de resíduos sólidos – mais especificamente do seu mercado, que podemos classificar como oligopsônio. As cooperativas de triagem de resíduos sólidos recicláveis não apenas separam os diversos materiais recicláveis do lixo doméstico, mas também comercializam esses materiais, fazendo com que reencontrem a cadeia produtiva. É justamente na comercialização que auferem os retornos econômicos que motivam a operação. Afinal, as Prefeituras geralmente fornecem galpões e caminhões para que as cooperativas realizem a coleta dos recicláveis, porém não remuneram o serviço.

Eis que os resíduos não são produtos ordinários. Detém, de forma geral, baixos valores agregados pois concorrem com matérias primas virgens. De forma distinta, entretanto, as matérias primas oriundas dos processos de reciclagem detém produção pulverizada e baixa escala. Além disso, os resíduos sofrem variações de preço de acordo com o estado físico dos materiais e o grau de contaminação.

A maioria dos resíduos triados é comercializado pelas cooperativas com terceiros, conhecidos como sucateiros ou atravessadores. São esses compradores que posteriormente revendem os materiais para as empresas de reciclagem ou em alguns casos diretamente para as indústrias. As cooperativas vendem os resíduos com a frequência média de quinze em quinze dias, sendo que os compradores buscam o material diretamente no local. Geralmente os compradores levam os materiais que estão disponíveis e acertam um valor para cada compra.

A maior partes dos galpões de triagem não detém estrutura para estocagem de materiais; da mesma forma, os cooperados não detém fluxo de caixa para suportar transações com prazos mais longos de recebimento. Essa situação fragiliza a relação de mercado das cooperativas em relação aos compradores, uma vez que há necessidade de se comercializar os materiais independente dos valores para se obter o giro necessário, tanto de estoque como de caixa**.

Dessa forma, o mercado das associações e cooperativas de triagem de resíduos é caracterizado como um oligopsônio, onde poucos compradores atuam. A situação é de fragilidade do vendedor frente ao comprador, cujo poder de compra permite ditar preços e auferir assim uma maior margem relativa nas negociações. Um mercado oligopsonista é o inverso do oligopolista, onde poucos vendedores ditam preços e auferem maiores margens relativas aos compradores, que são os tomadores de preço.

Adicionalmente, a grande pulverização do mercado de materiais recicláveis por meio de pequenas associações e cooperativas – praticamente uma em cada cidade de médio a grande porte – faz com que haja uma grande variação regional de volumes e preços do mercado de recicláveis, sem acompanhamento e publicidade de negociações e formação de preços nacionais.

Uma vez que a compra e venda de sucatas é em sua maioria realizada por sucateiros não formalizados e sem licenças ambientais, os níveis de preço tendem a se manter baixos e concorridos.

A título de exemplo, uma situação recente (abril/2015) do mercado de recicláveis no norte do Paraná: o quilo de PEAD de embalagens, de cor mista e bem triado, foi comercializado pela cooperativa no início do mês por R$ 0,90 e, no final do mês, por R$ 1,40. A variação de preços é enorme e em ambos os casos a cooperativa foi tomadora de preços, sem poder de barganha.

A renda dos cooperados e associados na triagem, claramente, torna-se uma fração do que poderia ser caso a estrutura de mercado dos recicláveis fosse alterado.

Uma das formas de se quebrar a dependência de poucos compradores é a venda direta das centrais de triagem para a indústria da reciclagem. Eis que a indústria demanda uma constância no fornecimento dos recicláveis e volumes mínimos significativos, dificilmente observáveis pelas pequenas e pulverizadas cooperativas e associações. Ademais, as indústrias não necessariamente estão próximas (questão logística) e aceitarão comprar os resíduos à vista.

Não obstante a dificuldade de negociação direta, uma ação em conjunto de associações e cooperativas de uma determinada região pode resultar em esforços comerciais e logísticos capazes de oferecer materiais recicláveis diretamente para as indústrias. A criação de uma união de associações regionais contorna as dificuldades de mercado enfrentadas.

Outra possibilidade de corrigir o mercado oligopsonista é por meio da redução da assimetria de informações entre vendedores (centrais de triagem) e compradores finais dos materiais (indústrias), informação hoje detida apenas pelos sucateiros. Uma iniciativa que intentou agregar informações sobre o mercado de sucatas e criar um cadastro nacional de indústrias e empresas que atuam no país com reciclagem é o Sistema Integrado de Bolsa de Resíduos da Confederação Nacional das Indústrias (CNI). Infelizmente, entretanto, tal iniciativa ainda não atingiu escala.

Por fim, a melhor forma de modificar a estrutura de mercado com vias a obter ganhos ambientais e sociais de grande escala é por meio da correta precificação da matéria prima virgem. Esta deveria ter preços de mercado mais altos em relação aos materiais recicláveis justamente por trazerem externalidades ambientais (consumo energético; emissão de gases de efeito estufa; extração de materiais virgens na natureza com potencial poluidor ou extração de recursos não renováveis).

* Outro fator que se soma aos mencionados é a ineficiência de gestão e organização das centrais de triagem, oriundos da baixíssima qualificação dos cooperados que, em sua vasta maioria, advém de situações de grande fragilidade social.