
“Viciados no hábito do crescimento exponencial”
A frase acima é do célebre economista ambiental Herman Daly, que a proferiu em 1974. Visto sob a ótica da estabilidade social, tal vício torna-se salutar à medida em que substitui a igualdade de renda. “Enquanto se cresce se tem esperança, e ela faz tolerar grandes desigualdades de renda”, na tradução livre das palavras de outro famoso economista, H. C. Wallich.
Qualquer problema induzido pelo crescimento é solucionado por mais crescimento. E assim, nessa tentativa de moto contínuo, estamos crescendo sem distribuição de riquezas e rumando -cada vez mais rápido- ao colapso ambiental.
A inverdade de welfare crescente trazida pelo PIB crescente é uma peça chave na resolução dos problemas ambientais. Vejamos como.
O PIB é um jabuti em cima da árvore
O PIB (produto interno bruto) significa o valor, a preços de mercado, de todos os bens e serviços produzidos em um país dentro de um determinado intervalo de tempo. Em assim o sendo, ele:
- aumenta quando poucos ganham muito, embora muitos possam ter perdido tudo para isso (não mostra a desigualdade de distribuição);
- aumenta quando atividades migram da informalidade para o mercado formal, sendo que há no mínimo uma manutenção de welfare (sendo mais provável uma redução);
- não distingue custos de receitas, mas sim as soma (se um contador fizesse “a conta do PIB” para uma S/A estaria sumariamente demitido, quiçá expulso do CRC!); e
- aumenta quando danos ambientais e à saúde são causados, mesmo sendo estes uma clara redução de welfare.
Em resumo, ele é um jabuti em cima da árvore: alguém o colocou lá, pois a única certeza é que sozinho ele não chegou! E é isso mesmo: o PIB jamais mensurou e sequer se propôs a mensurar desenvolvimento, muito embora tenha sido convencionado que este e crescimento sejam (erroneamente) sinônimos.
O que o PIB mede, afinal?
Em um discurso na Universidade do Kansas, em 18 março de 1968, Robert Kennedy (Senador Americano por Nova Iorque), explicou o que o PIB mensura:
“O produto nacional bruto não considera a saúde de nossas crianças, a qualidade da sua educação, ou a alegria de suas brincadeiras. Não inclui a beleza de nossa poesia ou a força de nossos casamentos; a inteligência do nosso debate público ou a integridade dos nossos funcionários públicos. Ele não mede nossa inteligência nem nossa coragem; nossa sabedoria e nossa aprendizagem; não mede nossa compaixão, nem nossa devoção ao nosso país. Mede tudo, em suma, exceto aquilo que faz a vida valer a pena“. (tradução livre)
Fluxo versus estoque
É um erro técnico utilizarmos o PIB como mensurador do total da riqueza produzida em país durante determinado período. O PIB é uma variável-fluxo enquanto a riqueza é uma variável-estoque. Comparativamente, é como confundir o estoque de água num reservatório em dado instante com os fluxos de entrada e saída de água desse reservatório num dado período de tempo.
Uma floresta virgem significa riqueza, ou capital natural. Não é contabilizada uma vez que não existem fluxos financeiros oriundos de sua exploração. Se cortada e exportada… aí sim a “floresta” conta para o PIB. Apesar de ser uma distinção simples, o que as separa essas variáveis de fluxo e estoque são visões quanto à incorporação de expectativas do futuro econômico sobre as decisões de produção e de investimentos no presente. Os estoques não precisam ser necessariamente explorados no presente, tal como a floresta exemplificada – são componentes de um capital intangível.
A importância dos capitais ambiental e social
O prêmio Nobel de Economia, Amartya Sen, argumenta que a prosperidade se faz de forma distinta de crescimento. Para prosperar é necessário uma combinação de estoques e fluxos – não só um, não só outro. Ainda, argumenta que o valor do capital social é peça chave e não mensurada pelo PIB. Por capital social, entende-se a capacidade endógena de mobilizar capitais tangíveis e intangíveis (empreendedorismo, cidadania, cultura da inovação etc.).
O mesmo paralelo deve ser feito para o capital ambiental – mensurá-lo na nossa medida de desenvolvimento. Um reservatório é alterado pelo fluxo da entrada e saída de água, mas é composto igualmente pelo seu estoque. Quando deixamos de contabilizar nosso estoque de riquezas, ambientais e sociais, deixamos de considerá-los!
É possível termos um PIB verde
Devemos começar a reformular nossa medida “mor” de crescimento. Uma das maneiras de contabilizarmos nosso estoque de riqueza ambiental seria deduzirmos do PIB as reduções irreversível (isso é, não recicláveis) nos estoques de recursos naturais.
Devemos ir além e deduzirmos:
- os custos incorridos pela poluição e degradação ambiental;
- os gastos com defesa;
- gastos com tratamentos de saúde;
- custos sociais tais como manutenção de cadeias, divórcios, etc.
Após esses ajustes teríamos, enfim, uma medida de welfare, ou desenvolvimento.