
Incorporando o Capital Natural: A grande encruzilhada empresarial
As ONGs ambientalistas não vão “salvar o mundo”. O que de fato fazem é: testar pilotos que podem ganhar escala; levantar problemas ambientais que podem ser endereçados por políticas públicas. Eis que os Governos também não vão “salvar o mundo”. O andamento das negociações internacionais sobre mudanças climáticas é apenas um indicador da inação política de norte a sul, leste a oeste. De fato, os únicos agentes que podem fazê-lo são as empresas.
Mas não são justamente as empresas que, ao visar performance e lucratividade para seus acionistas como única prioridade, utilizam-se dos recursos naturais de forma insustentável? Sim, e é por isso que detêm o poder de mudança.
A economia de mercado aloca bens e serviços pelo cruzamento entre demandas e ofertas; mudanças nos preços produzem ajustes nos padrões de consumo e de produção. As alocações dos recursos de produção se dão pelos preços: mudanças nestes produzem ajustes e privilegiam inovação tecnológica e redução de materiais.
Os preços são balizadores de trocas mutuamente benéficas e representam a combinação socialmente ideal entre a abundância relativa (escassez) e o valor (percepção social) dos fatores de produção. Conforme Adam Smith, a busca privada pelo lucro se traduz em benefícios à sociedade por atender as necessidades humanas.
Eis que a lógica da mão-invisível não vêm produzindo os efeitos desejados… mas isso ocorre não porque a economia de mercado é falha, mas sim porque há uma distorção nos próprios preços por não contabilizarem externalidades.
Ao visar o lucro (e, genuinamente, apenas isso), as empresas demandam, combinam, transformam e administram capitais financeiros, físicos, humanos, sociais e naturais. As empresas que mais geram valor são aquelas que gerem todos estes de maneira sustentável ao seu negócio. Incontáveis esforços acadêmicos precificam, por exemplo, os valores intangíveis (porém à mercado) de uma marca ou de uma patente tecnológica. Empresas inovadoras se instalam em Nova Iorque em busca do capital social que por lá abunda.
Apenas recentemente, entretanto, iniciaram-se esforços de precificação do capital natural. Esse é o capital que permite à Ambev captar água em quantidade e qualidade suficiente da bacia hidrográfica do Piracicaba-Capivari-Jundiaí (PCJ), em São Paulo, para atender as demandas de sua maior planta na América Latina. Alterações negativas nesse capital gerariam custos bastante tangíveis: necessidade de reuso de água, maiores custos de tratamento… A perda desse capital pode resultar na necessidade de relocação da planta.
O capital natural ainda não está à mercado. Por enquanto, ao menos, começou a ser precificado e revelado, e esse é o primeiro e necessário passo para ser incorporado.
O principal exemplo dessa irreversível tendência é a PUMA, que desde 2010 publica sua DRE Ambiental. Em 2012, para chegar aos US$ 300 MM de lucro líquido a empresa causou externalidades de US$ 94 MM. Ou seja, quase 1/3 de sua lucratividade não deveria ter existido, mas sim deveria ter abatido suas emissões de gases de efeito estufa, gerido seus resíduos de forma correta, retornado água limpa aos rios dos quais captou o recurso fundamental à sua produção.
Empresas como Coca-Cola e Unilever também estão produzindo seus demonstrativos ambientais. Iniciativas como o TEEB e o B Team compilam métodos e agregam pressão institucional. Edimburgo sediou em 2013 o primeiro Fórum Mundial de Capital Natural (a adesão de grandes empresas demonstrou tamanho sucesso que o 2º Fórum já está marcado para 2015). Oito países assinaram, na Rio +20, um pedido para que governos incorporem o capital natural nas contabilidades nacionais.
Caso a precificação e contabilização do capital natural se torne a norma no mundo dos negócios, as empresas pagarão por suas externalidades (precificadas à mercado). O sistema de preços promoverá as realocações socialmente ótimas dos fatores de produção de forma orgânica; as empresas eficientes, inovadoras e bem geridas sobreviverão; as demais deixarão de existir. O ambiente empresarial de amanhã continuará o mesmo; o planeta estará bem melhor. Estamos na encruzilhada.